A SOMBRA DO PESSEGUEIRO

quinta-feira, 28 de maio de 2009

JORGE BARBOSA - ANTOLOGIA POÉTICA COMENTADA


JORGE BARBOSA - ANTOLOGIA POÉTICA COMENTADA



O BAILE

No baile
A morna
Entorna
Dolências...

O rabequeiro
Compassa
A música,
Batendo a planta descalça
No chão.
E os pares
Giram
Apertados
Uns contra os outros,
Levados
Na morna...

O rectângulo do quarto
É terra
Batida
E dura,
Como não vem
Nos manuais da Arquitectura...

A um canto,
A preta sadia
Amamenta
Uma criança luzidia,
Toda nua e sorridente.
E olhando-a aumenta
O seu sorriso contente,
Num ar
Feliz,
Que faz lembrar
Virgem Maria
Quando
Ficava
Olhando
Cristo-Menino...

Que o filho que traz ao peito
É para ela
Um pequenino
Jesus,
Todo esculpido
Em ébano
Polido...

No ambiente
O cheiro
Forte

A suor,
Mais o aroma
Da aguardente...

No baile
A morna
Entorna
Dolências...

(in revista Descobrimento, vol. II, Lisboa, 1932, pp. 56-57)

terça-feira, 1 de julho de 2008

COMO ESCREVO poema de marilda confortin

COMO ESCREVO poema de marilda confortin

Escrevo o que dá na telha

sem ser semeado

seja musgo, mofo

ou alecrim dourado.

Escrevo sem compromisso,

por capricho e por relaxo

por influencia do Leminski

ou por puro desabafo.

Se o que faço

é poesia ou heresia

ninguém tem nada com isso.

Sou feliz assim, acho.

FERNANDO PESSOA, E-MAIL, CELULAR, BATE-PAPO, CARTAS, VIVER NÃO É “PRECISO,” CLEÓPATRA E JULIO - carta (resposta) de jb vidal para tonicato miranda

FERNANDO PESSOA, E-MAIL, CELULAR, BATE-PAPO, CARTAS, VIVER NÃO É “PRECISO,” CLEÓPATRA E JULIO - carta (resposta) de jb vidal para tonicato miranda

caro tonicato,

como você também cheguei a pensar que as cartas haviam sido superadas, uma vez pelo telefone, depois recados pelo fax, mais tarde pelo e-mail, celular e ultimamente pelos sites de bate-papo em tempo real e tudo isso “sem selo.” mas não, o que e como você pode se expressar em uma carta creio que nunca o faria através dos meios a que me referi. não, não faria. estou convencido que por algum (muito) tempo a escrita impressa se fará necessária senão pela cultura, pelo hábito, pela questão econômica, porquanto os investimentos necessários para que se acesse o mundo virtual ainda são muito altos para quem quer um PC em casa, considerando-se os níveis salariais do mercado de trabalho. eu observo pelo site, os dias de maior acesso são de segunda a sexta, sábado, domingo e feriados a quantidade cai, por quê? os usuários não tem computador em casa. acessam do local de trabalho. creio que ficará assim, até quando não sei; os correios continuarão a entregar além das drogas e das encomendas, as cartas, milhares de cartas diariamente.

devo desculpar-me com você com respeito ao convite de comermos algumas ostras, não sabia que não te apeteciam, que não fazem parte da tua cultura gastronômica; mas, acho que com a continuidade de se preencher o sábado, no final da manhã, acabarás por identificar algo “familiar” naquelas preciosidades que, por essa razão, terminarão por te conquistar o paladar. o BOSCATO/merlot estava excelente. degustar ostras com vinho na praça do “homem nu”, realmente, pensando bem, não é para os fracos de caráter.

devo te dizer que aquela referência, na primeira carta, à igreja no final da rua, que a vistes desde onde te encontravas, fez-me lembrar das “buscas” em que o homem vive o tempo inteiro de sua vida. engraçado, não é? eu costumo dizer que existindo Deus ou não somos seus “prisioneiros.” coisas do livre pensar.

não posso me alongar, já que o tempo corre e eu só caminho, em razão de compromissos assumidos e intransferíveis, mesmo assim queria fazer um rápido comentário sobre a célebre frase “navegar é preciso, viver não é preciso”, a que te referistes, na última carta, após um comentário sobre o poema “Todas as Cartas de Amor são Ridículas” do nosso grande Fernando Pessoa. da maneira como falastes sobre aquela frase, é óbvio que a lestes pelo menos no poema de Pessoa; ele realmente utilizou tal frase e, por isso, uma grande maioria de pessoas que o leram acreditam ser dele a autoria quando não é. o autor da frase chama-se Julio César, o Romano, que ao dirigir-se Mar Mediterrâneo à dentro para conquistar o Egito viu-se diante de terrível tempestade que obrigava a todos seus generais e soldados pedirem para retornar, no limite do amotinamento, quando então, ele mal seguro a um mastro grita: “navegare nececere, vivere non nececere!” recuperando a confiança de seus homens a ponto de invadir e conquistar a pátria de Cleópatra. há ou houve, não sei, uma discussão, moderna, de que Julio César teria afirmado no sentido de “precisão” e não de “necessidade.” mas se ocorre ou ocorreu tal discussão, para mim, são filigranas inúteis ou coisa de pensador desocupado. o grande Pessoa não é responsável por isso.

era só.

JB VIDAL

23/06/08

AS CHUVAS poema de h. dubal

AS CHUVAS poema de h. dubal

Nas mãos do vento as chuvas amorosas
vinham cair nos campos de dezembro,
e de repente a vida rebentava
na força muda que as sementes guardam.

Nas ramas verdes rebentava a luz
e a doçura do tempo transformava
a terra e o gado na pastagem tenra
na alegria dos rios renovados

Cheiro de gado e de currais suspenso
no ar que os dedos do inverno vão tecendo
mais um vez nos campos de dezembro.

E nos trovões a tarde acalentada,
cantiga de viver que a chuva traz
numa clara certeza repetida.

H. DUBAL - Poeta Crítico, leitor de Sartre, Rilke, T.S.Eliot e Camus… existencialista. Nào falava de si, discreto. falava do mundo, criticava a modernidade…entregou as moedas ao barqueiro há dois meses.

EM NOME - POEMA DE Jorge Barbosa (iarajá)

do pai
do fumo da filha da grana
do álcool dos espíritos do mundo da fama
das drogas do mundo o êxtase das modas do mundo
a vagina da cama o falo
do coma
dos sonhos do mundo
a foda
da trama
do palco
das máscaras do mundo
a merda
da forma
do fundo
das estruturas do mundo
a mola
da bala
da vala
dos mortos do mundo
o mudo
da muda
do mundo
das flores do imundo
amém…